No último post falei
sobre como me descobri um dos pequeninos, ontem, fui novamente inserida no
Evangelho, tornando-me como Bartimeu, o cego. Esse pequenino que era
desprezado, deixado “a beira do caminho”, com suas deficiências e dificuldades.
Ao escutar o Evangelho, já consegui “entrar” na história, ver a situação com o
olhar da fé, e me colocar na situação daquele pequeno. Conforme o padre
realizada a bela homilia, todo o acontecimento bíblico foi se misturando a
minha vida.
A atual situação do meu coração faz-me estar como que cega,
a beira do caminho, sem enxergar futuro e sem conseguir dar um passo. Mas assim
como Bartimeu, estar à beira do caminho é ter esperança, saber que nada está
perdido, mas que aguarda o socorro chegar. Se a esperança houvesse se
dissipado, Bartimeu já estaria escondido, tendo desistido de viver. A esperança
é o que o mantêm; a esperança é o que me mantém. Estamos à beira do caminho por
não sentirmos pertencentes a nenhum grupo, como que isolados com nossa dor, com
nossa deficiência.
E aí eis que surge uma multidão de vozes, difícil reconhecer
do que se trata, provavelmente ouvimos alguém contar sobre Jesus, seus
milagres, seu poder. O que os olhos não podem ver, a alma pode, reconhece seu
dono, o Senhor da sua vida, Aquele que pode tirar daquela situação. O medo
talvez pudesse ter nos calado, mas ao vencê-lo, nos pusemos a gritar, a
proclamar: “Jesus, Filho de Davi, tem piedade de mim!” Talvez meio tímido, mas
o suficiente para que muitos ouçam. Pessoas que apesar de seguir Jesus, ainda
não reconheceram na sua alma quem Ele o é; ainda não fizeram a experiência de
deixar a vida ser transformada por Cristo; ou como o padre disse na homilia,
pessoas que ao querer que Jesus leve a Boa Nova para alguns, esquece que a Boa
Nova é para TODOS, sem exceção. Qualquer que seja o motivo, mandam-nos calar,
como se a nossa dor não importasse, não prestam atenção nas dores que sentimos,
na nossa história, enfim, a insensibilidade dói mais que o que antes nos feria,
mais do que a cegueira. Bartimeu e eu lembramos o porquê estamos à beira do
caminho, porque as pessoas não sabem mais acolher a dor e a cegueira, preferem
excluir e ficar somente entre aqueles que “são perfeitos”.
Novamente isso poderia ter calado a ele e a mim. Confesso
nessa parte que Bartimeu precisou apenas de uma chance para ter a coragem de
gritar mais forte ainda. E eu já tive tantas e não aproveitei... Enfim... A
coragem venceu o medo e a vergonha e ambos gritamos ainda mais forte: “FILHO DE
DAVI, TEM PIEDADE DE MIM!” Novamente digo, o coração reconhece seu Dono, seu
Amado, mesmo ferido pelos erros e pecados.
Jesus já sabia de tudo isso, de todo o coração de Bartimeu,
como sabe desse coração aqui. Ele já havia escutado desde a primeira vez que
chamamos, mas Jesus espera que alguém se coloque a disposição, confiando que
aqueles que estão próximos a Ele já aprenderam a acolher e amar os pequeninos.
Quando vê que não é bem assim, Ele mesmo se pronuncia a alguém: “chame-o”. O
convite é feito a alguém que Jesus sabe que não irá nos abandonar, que chegará
até nós e dirá: “Coragem, levanta-te, Jesus te chama”.
Aqui nesse ponto quero me estender mais do que já tenho me
expressado aqui. Sempre haverá alguém para fazer esse papel de “chamador”, de
“encorajador”. É o bom samaritano, com outro nome, mas aquele que estará lá
sempre dizendo: “coragem; não desista; sei que Jesus tudo pode; nada é
impossível para Ele; isso vai passar; confie; levanta-te; vá ao encontro Dele,
conte seus problemas, mesmo Ele já sabendo tudo”. É aquela pessoa que realmente
deixou Deus se encarnar na sua vida, fazer morada no seu coração. É o que
muitos chamam de anjo, pessoas enviadas por Deus para ser luz na escuridão e
mão segura a guiar quando nós mesmos não enxergamos o caminho.
Ao ser encorajado, ao nos sentirmos amados, temos a coragem
para dar um salto – mesmo que pareça engraçado um cego dar um salto – confiando
que não vamos cair, porque há alguém ao nosso lado. Temos a coragem de “jogar o
manto”, ou seja, deixar para trás a vergonha, o pecado, a dor, a indiferença
que cobria nosso coração. E o mais importante, temos a coragem de caminhar até
Jesus.
Se o coração de Bartimeu ficou como o meu durante a homilia,
ele também sentiu o coração bater mais rápido, as lágrimas caírem, a esperança
se fortificar – lembra que ela nunca havia ido embora? – ao se aproximar de
Jesus Cristo.
E por óbvio que pareça, por mais que Jesus já saiba o que
queremos, Ele questiona: “o que queres que eu faça?”. Ele não questiona porque
acha que vamos pedir algo diferente, mas porque sabe que é preciso que tenhamos
a coragem de dizer o que ainda nos falta, o que nos fere. Assim como Bartimeu,
meu pedido é: “Mestre, que eu veja!” Que eu veja a dor como sinal de amor, de
crescimento, de caminhada, que eu veja o que precisa ser revisto em minha vida,
o que preciso mudar, o que posso fazer para seguir Jesus de forma corajosa e
fiel.
“Vai, a tua fé te curou!” Fé que nos faz sair do lugar, do
comodismo, da “beira do caminho”. Fé que nos impulsiona a seguir o Amado, o
Mestre e Senhor da nossa vida.
Gratidão a Deus por ter dado em minha vida mais pessoas me
dizendo “Coragem!” que pessoas me mandando calar, ou melhor, por fazer que as
pessoas que me dizem “Coragem!” sejam mais ouvidas por mim, no hoje! E gratidão
a Deus também, pela graça de utilizar a homilia de ontem para tocar meu
coração, para que o Evangelho se encarnasse em mim e virasse vida e texto.
Que Deus abençoe
cada um de nós, pequenos!
Michele Cristina